Surjam bons projetos que não faltarão meios para os apoiar. Esta é a promessa de Ana Abrunhosa, presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro (CCDRC), que, nesta entrevista, explica prioridades e objetivos do Programa Centro 2020.
Apoiar a competitividade das empresas e combater o desemprego jovem são dois dos grandes objetivos do Centro 2020, sublinha a presidente da CCDRC, a entidade de gestão deste Programa. Em entrevista à Revista INVEST, Ana Abrunhosa explica quais as áreas prioritárias de apoio ao investimento do Centro 2020 e aponta caminhos às empresas e instituições de ensino, centros tecnológicos e autarquias.
A CCDRC vai gerir a distribuição de cerca de 2,1 mil milhões de euros de apoios para tornar a Região Centro mais competitiva. Uma das metas é que represente 20% do PIB em 2020, sendo que em 2011 representava 18,6%. Quais são as linha-âncora para aumentar a competitividade no Centro?
Dois pontos percentuais do PIB é uma meta ambiciosa. Uma das grandes fragilidades do nosso tecido económico é a baixa produtividade e outro problema grave é o elevado desemprego jovem. E temos simultaneamente um desemprego estrutural preocupante. Considerando isto, e considerando que quem cria emprego e riqueza são as empresas, a grande aposta do Centro 2020 é na competitividade das PME.
Para isso vamos ter linhas de apoio aos fatores imateriais de competitividade, em diversas questões, designadamente na reorganização, no design, na marca, na certificação, no ecolabel, na disponibilização de informação sobre o mercado, a fim de lhes permitir ter produtos diferenciados no mercado internacional. Para além da inovação, vamos apoiar programas de Investigação e desenvolvimento (I&D), quer de forma individual quer em parceria com entidades do sistema científico e tecnológico.
Por outro lado, o Programa vai passar a ser multifundos e, portanto, permitirá gerir projetos integrados, isto é, em simultâneo com projetos de investimento podemos ter outros que envolvam a formação dos empresários e dos trabalhadores.
Para isso, é importante uma ligação entre as empresas e o sistema de ensino?
É prioritária para nós. Não podemos ignorar que muitos problemas das empresas não conseguem ser resolvidos sem se incorporar conhecimento novo. Para isso é necessário que as empresas trabalhem com as universidades, politécnicos, centros tecnológicos, que são quem detêm o conhecimento e podem ajudar a reposicionar as empresas em atividades de maior valor acrescentado.
A única maneira de valorizar recursos, sejam endógenos, competências ou outros, é através da incorporação de conhecimento e é muito importante promover essas parcerias com entidades do sistema científico e tecnológico.
A Região Centro tem uma economia diversificada. Congrega setores tradicionais, como a cerâmica, extração de minérios, floresta, com setores mais jovens, como os moldes, plásticos, biotecnologia e as TICE, e existem outras que estão a ganhar importância crescente, como o turismo. Na sua ótica deve ser feito um esforço em qual das áreas destes setores?
Não é a autoridade de gestão do Programa Centro 2020 que deve dizer em que setores de atividade os empresários devem investir. Mais do que os setores, temos exemplos de sucesso em setores tradicionais, que às vezes até estão em declínio.
Quanto às áreas, o uso eficiente dos recursos, é para nós fundamental. São projetos onde vamos dar prioridade, onde o contributo para o emprego qualificado seja também determinante. Estamos a falar de projetos internacionais, de produtos, bens ou serviços transacionáveis, que sejam inovadores – não podemos financiar projetos de substituição de equipamentos -, têm de ser projetos que alterem o perfil de especialização da nossa economia. Vamos assim dar prioridade a questões com o uso eficiente dos recursos, a eco-inovação, o contributo dos projetos para o emprego qualificado, para o aumento das exportações ou substituição das importações.
O que quer dizer com eco-inovação? De que forma podem as empresas usufruir desse tipo de apoios?
É uma área que damos destaque e tem a ver com a necessidade de incorporar as questões ambientais nas empresas. Começam pela eficiência energética e depois passam para os produtos. No caso do calçado, podemos falar num sapato em que todos os seus componentes sejam reutilizados. As questões ambientais, da inclusão social, da eficiência, são orientações da própria estratégia da Europa 2020 e que serão valorizadas.
Cerca de 12,5% das verbas do Centro 2020 vão para o ambiente e eficiência dos recursos, se somarmos aquilo que são as economias com baixa emissão de carbono (mais 8%), temos mais de 20% dos recursos com as preocupações ambientais.
Nas empresas, uma questão que pesa muito nos seus custos, é a energia. Vamos ter uma linha específica de apoio às empresas para que adotem processos de produção mais eficientes em termos energéticos, que até prevê a auto-produção de energia. A ideia é que esta componente de custos, muito pesada nalguns setores, possa gerar maior competitividade.
A importância de reforçar a competitividade e a internacionalização das empresas está bem espelhado no Programa, que absorve metade das verbas…
No nosso caso é mais de metade, e se considerarmos a linha da eficiência energética, ou seja, a competitividade, a inovação e o conhecimento representam no próximo quadro 56% do FEDER, quando no anterior quadro nem chegava a 40%.
Num diagnóstico à Região Centro, a CCDRC constata que há que alargar o peso das atividades económicas geradoras de valor acrescentado. É por essa via que os empresários devem ir?
É. Ou seja, se os empresários não têm competências em áreas que não representam maior valor do produto final, como o design, conceção, I&D, distribuição, que era o que acontecia nos anos 80, só se irão apropriar de uma área pequenina do valor do produto. As empresas têm de ganhar novas competências, devem alterar-se, contratar pessoas qualificadas e, para isso, vamos dar apoio. Não é fácil a uma empresa tradicional entrar em novas áreas de competência, mas ao fazê-lo significa que ela é responsável por uma parte maior do valor final e irá ser mais competitiva.
Uma empresa que só produza para um cliente, é facilmente substituída. Uma empresa com conceção e desenvolvimento do produto, não o é.
Tem falado das debilidades existentes no nosso tecido económico que podem ter apoios no Centro 2020. Em concreto, quais são prioritárias?
A baixa competitividade das empresas é a nossa preocupação, associada a uma taxa global de desemprego, que não é grande, mas depois em termos desagregado, temos uma taxa de desemprego jovem elevada e o desemprego estrutural também é grande.
Resolver a questão do desemprego jovem é fundamental, pois estamos numa região que qualifica muitos jovens para o país e não é capaz de reter todos esses jovens. A única forma de o fazer é termos empresas que os absorvam e, para isso, significa que os currículos devem estar adaptados às necessidades das empresas. O apoio aos projetos inovadores visa colmatar esse problema e, simultaneamente, aumentar a produtividade das empresas.
Na área do desemprego estrutural estamos mais focados em projetos de economia social, na criação do próprio emprego e da própria empresa. Acreditamos que os Gabinetes de Ação Local nos podem ajudar nesta missão, nomeadamente para apoiar a criação do próprio emprego e as microempresas, área para a qual temos recursos significativos.
96% das empresas da Região Centro têm menos de 10 trabalhadores e baixos índices tecnológicos. De que forma é que uma microempresa pode ter a veleidade de sonhar em ganhar competitividade?
Só posso dar esperança com bons exemplos de empresas que conseguiram fazer a mudança para uma base tecnológica. Diria que o mais fácil é comprar a tecnologia.Mas o problema são os recursos humanos e depois incorporar essa tecnologia.
Precisamos de uma gestão mais profissional nas empresas, de recursos qualificados e aproveitar a mudança de gerações. As empresas, quando se apercebem da importância em mudar esses aspetos, conseguem manter-se num setor tradicional e elevar o índice tecnológico, como aconteceu no calçado e no têxtil. No Portugal 2020 existem apoios para as empresas adquirirem tecnologia, para que a incorporem e se apropriem dela.
Essa mudança geracional na gestão, que tem sido um problema, pode ser uma oportunidade para as empresas?
Sim, acho que é urgente nas empresas começarmos a ter uma gestão profissional e de que as empresas se apercebam que os jovens, mesmo sem experiência, trazem valor. Devem também fazer a aproximação aos centros de conhecimento, quando têm problemas, e de começar a falar novas linguagens. Uma empresa tradicional, que não tenha recursos humanos qualificados, como é que faz uma parceria com uma universidade se não fala a mesma linguagem?
Essa falta de ligação entre empresas e instituições de ensino é culpa de quem?
Coloco a pressão nos dois. Nas universidades, e sou testemunha disso, houve uma grande mudança de atitude e de abordagem, uma vez que se abriram cada vez mais à comunidade e estão cada vez mais despertas para criar valor com o conhecimento que têm e até prestar serviços às empresas. Sabemos que as velocidades das universidades não são iguais às das empresas. Do lado das empresas, muitas vezes não existem recursos para falar a mesma linguagem.
Para haver investimento é necessário haver confiança, que não abunda, e também condições, mas as empresas estão descapitalizadas e alguma insuficiência de resposta do sistema financeiro. Neste contexto, de que forma os empresários poderão recorrer a fundos, que são reembolsáveis? O que é necessário aos empresários para que possam acreditar, uma vez que vivemos um clima recessivo em termos económicos e de confiança?
Tenho um otimismo moderado em relação a estes aspetos. Da última vez que abrimos concursos para empresas, a procura foi extraordinária e, portanto, registámos uma grande intenção de investimento em projetos de muita qualidade. Apesar de todas as preocupações acredito que há muitas empresas com vontade de investir. Há o problema de muitas delas estarem descapitalizadas e de a banca não dar resposta.
Neste novo quadro comunitário vamos ter apoios competitivos para ajudar as empresas na contrapartida nacional. Uma das missões do chamado Banco de Fomento é apoiar as empresas na sua contrapartida nacional ou dar garantias quando vão à banca. Ou seja, vai ser possível a uma empresa ter apoio FEDER para um projeto de investimento e, simultaneamente, ter um apoio competitivo para a sua contrapartida nacional.
Vai ser criada uma estrutura de apoio às candidaturas na CCDRC?
Estamos a criar um gabinete, com pessoas experientes, que tem como principal missão divulgar os apoios do Portugal 2020 e também de outras fontes de financiamento disponibilizadas pela própria Comissão Europeia. A ideia desse gabinete é fazer divulgação, receber os promotores mas também está previsto ajudar a elaborar e a financiar a candidatura ao horizonte 2020 ou a outros programas comunitários. São áreas onde há muita competitividade e onde as empresas e as instituições portuguesas ainda precisam de apoio para aprender a fazer bem. Hajam bons projetos e não faltarão meios para os apoiar.
Significa que além dos programas regionais e nacionais, no âmbito do horizonte 2020, a CCDRC vai também apoiar candidaturas diretas à União Europeia?
É isso. As nossas universidades, as nossas empresas, municípios ou associações, têm de fazer as candidaturas em consórcios. O que exige uma preparação grande, pois estamos num campeonato diferente. Temos de arranjar o melhor método para os apoiar.
A Região Centro possui fortes assimetrias de desenvolvimento intrarregionais, em termos de distribuição do tecido produtivo, das atividades geradoras de emprego e de nível de rendimento. Enquanto presidente da CCRDC, e enquanto agente de desenvolvimento regional, que medidas preconiza para dirimir estas assimetrias?
A baixa densidade não é só no interior, pois temos no litoral zonas muito frágeis e deprimidas, por exemplo em Torres Vedras. No último quadro tivemos um programa para zonas de baixa densidade, que é o Provere – Programa de Valorização de Recursos Endógenos, que envolveu agentes públicos e privados. A ideia era fazer uma diferenciação positiva. A primeira coisa a fazer é que temos de diferenciar os projetos que se realizam nestas zonas, eventualmente na taxa de cofinanciamento, com condições mais favoráveis.
Pessoalmente acredito que temos de dar dinheiro a fundo perdido às pessoas para iniciarem os seus negócios. Temos de arriscar, de confiar, para ajudar as zonas de baixa densidade. Uma boa ajuda que o Governo faria, em termos de fiscalidade, era diferenciar positivamente as empresas que se localizem naquelas zonas.
O destino destes territórios está nas pessoas e nas empresas. Defendo, por isso, que os projetos sejam ancorados nas empresas, nas pessoas e nos recursos do território para criar sustentabilidade. Temos um programa especial que será a continuidade do Provere, para apoiar de forma diferenciada, quer para startups quer para as empresas.
O Programa também contempla apoios para os municípios?
Nós vamos continuar a dar importância à política de cidades. Estamos a falar na valorização de espaços públicos, de equipamentos de uso comum, sobretudo para criar novas centralidades em zonas onde deixou de haver vida. Estamos a falar de projetos de coworking, espaços criativos, de recuperar centros históricos e de lhes devolver vida e atividade. Esse eixo da política de cidades assume para nós uma importância muito grande. Os principais beneficiários vão ser os municípios, mas quem vai beneficiar é a população em geral. Vai ser atribuído mais de 200 milhões de euros.
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